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domingo, 19 de maio de 2013

A RIVALIDADE DENTRO DO CAOS NAZISTA


Naquele domingo de junho, de 1941, Berlim acordou com a notícia de que as tropas nazistas haviam invadido o território de Soviético mas aqueles dias não seria, para o alemão, o episódio mais importante do dia. Estava programado para acontecer naquela tarde, no Estádio Olímpico da cidade, a final de um importante torneio de futebol.

Lá, os campeões Schalke 04, clube favorito dos adeptos do regime nazista, iriam enfrentar o Rapid Viena time que defendia a Áustria, país recentemente anexado à Alemanha. A partida prometia, e a rivalidade política existente entre os dois lados só aumentava o interesse da população alemã. 

Com ascensão do nazismo, o futebol alemão viveu um período de renascimento. A estrutura do jogo foi profundamente modernizada, o que aumentou o interesse das torcidas e escancarou o talento dos jogadores, que, de olho no crescimento do esporte , empenharam-se como nunca. O regime de Hitler foi mestre em explorar o potencial do futebol, o “teatro do povo”, como divulgador da imagem do movimento nazista. As estrelas dos times alemães passaram a se tornar verdadeiros garotos-propaganda da ideia de supremacia ariana.

A renascença do futebol alemão ocorreu quase que simultaneamente ao período do florescimento de um dos mais famosos clubes de futebol do país, o Schalke 04. Saído do humilde subúrbio industrial de Gelsenkirchen (na região de Ruhr) o Schalke 04 amargou a derrota do campeonato de 1933 para, no ano seguinte, voltar a triunfar sobre o então favorito time do FC Nuremberg (região da Baviera). E este era apenas o começo de uma notável sequência de vitórias. O time chegou à final em sete dos oito campeonatos seguintes e conquistou o título em cinco deles.




Em 1941, na final do campeonato, o time do Schalke 04 enfrentaria um duro adversário, o Rapid Viena, que vinha de uma excelente temporada. A seleção nacional austríaca de futebol tornara-se uma das mais fortes do mundo nos anos de 1930. Depois de 1938, quando o país foi anexado à Alemanha e os times austríacos rapidamente impuseram sua presença na disputa pela Liga alemã de futebol, a rivalidade, então, cresceu.

Naquele ano o Rapid Viena venceu a copa alemã. No ano seguinte, em 1939, outro time austríaco chegaria à final: o Admira Viena, que ficou apenas com o vice-campeonato. Em 1940, novamente o time do Rapid estaria nas finais, mas não levou o título. A presença dos austríacos do Rapid Viena na final do campeonato de 1941 simbolizava, portanto, mais um indício do evidente crescimento do time.

A partida naquela tarde de domingo era um confronto imperdível para austríacos e alemães. Não fosse apenas a rivalidade no futebol, havia também uma acentuada rivalidade regional. Ignorando a origem austríaca do Führer, a cultura alemã de, tradicionalmente, fazer uma divisão norte-sul vigorava à todo vapor – protestantes contra católicos e “prussianos” contra austríacos.


Os habitantes do norte da Alemanha insistiam em colocar os austríacos em um patamar inferior. Já os nascidos na Áustria, por sua vez, viam os alemães do norte como incultos e arrogantes.

Em 1939, um episódio viria, então, exaltar ainda mais os ânimos. Matthias Sindelar, um das principais estrelas do futebol austríaco, morreu misteriosamente depois de recusar-se a defender a camisa alemã. Suspeita-se que Matthias tenha sido assassinado pelos nazistas.

Embates físicos tornaram-se comuns nas disputas entre os times austríacos e alemães. Em 1940, inúmeros jogos foram marcados por brigas. E a violência não ficava restrita às arquibancadas. Em uma partida entre um time da Luftwaffe de Hamburgo e um time de Viena houve uma série de incidentes violentos e o goleiro austríaco, após alguns confrontos brutais, deixou a partida seriamente ferido. Mais tarde, o jogador morreria no hospital.




O espírito competitivo cada vez mais contaminava as opiniões dos torcedores. O sentimento antinazista carregado pelos austríacos direcionava-se ao time predileto pelo regime de Hitler: o Schalke 04, também conhecido pelas alcunhas “Os Mineiros” ou “Os Azuis Reais”.

Cada vez mais próximo da administração nazista, os jogadores do Schalke passaram a receber honrarios do governo, como posições de destaque nas tropas nazistas a AS. Os atletas que brilhavam mais, como Ernst Kuzorra e Fritz Szepan, eram, inclusive, utilizados como porta-voz da propaganda nazista. Até mesmo Hitler torcia pelo time. O Schalke passou, então, a representar o movimento nazista e, assim, os embates entre eles e qualquer time de Viena tornaram-se palco de muita violência. O jogador Kuzorra, por exemplo, foi nocauteado em um jogo, e, no encontro entre o time do Admira Viena e o Schalke, em novembro de 1940, uma limusine nazista e um ônibus do time alemão acabaram depredados. Por todas essas razões, àquela altura, o jogo de 22 de junho de 1941 interessava mais aos alemães do que a invasão nazista a URSS.

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